Factotum - O Barbeiro da Vila - por Mário de Méroe

             FACTOTUM – O Barbeiro da Vila[1]

Coletânea de “causos” comentados no salão de um singular barbeiro, em minha Vila.

 

Introdução

 

É opinião comum que os barbeiros – modernamente chamados de “cabeleireiros” são o repositório da cultura de uma comunidade. Em seu honrado labor, eles ouvem piadas, contos engraçados, lendas urbanas e, às vezes, verdadeiros históricos de vida. O que ninguém conta nem para seu melhor amigo, certamente o contará para o seu barbeiro!

Assim, com o passar dos anos e com sua clientela fielmente formada, o barbeiro passa, também, a ser consultado sobre todos os assuntos. Com sua vasta experiência acumulada no trato diário, ele forma uma filosofia que lhe permite opinar sobre todas as coisas trazidas ao seu conhecimento. Transforma-se em terapeuta popular de seus clientes, e sempre é ouvido com atenção e reverência.

Muitas vezes, dado sua experiência anterior ou adquirida no dia a dia, ele faz pequenos consertos, troca pneus de carros de suas clientes, configura computadores e celulares, ensina aos garotos os novos jogos de video games, etc. Acaba tornando-se um faz-tudo, a versão moderna do esperto Fígaro, o famoso factotum imortalizado por Gioacchino Rossini, na ópera “O Barbeiro de Sevilha”, cuja estreia teve lugar em Roma, em 1816.

Barbeiro também é cultura!

Nosso herói não foge à regra; é a pessoa mais popular na Vila. Seu nome verdadeiro poucos sabem; ele é conhecido pelo que faz, ou seja, tudo. Um cliente comentou certa vez que ele era um factotum, ou seja, faz-tudo. Desde então, o estimado barbeiro passou a ser chamado por “Factotum”, abreviado, carinhosamente, para “Fac”.

Seu salão é o mais conhecido da Vila, e encontra-se localizado no início da rua, entre parte movimentada dos grandes escritórios e restaurantes, e os prédios residenciais. Logo na entrada já se vê o salão de Fac, severo e masculino, não faltando revistas eróticas e jornais do dia. Discretamente oculto, um pequeno tonel da “branquinha”, que ele oferece aos amigos mais chegados.

Ao lado, no conjunto destinado às senhoras, há uma entrada enfeitada por delicados tapetes franceses, e flores que exalam suave odor insinuante de sensualidade e elegância. Suas clientes são atendidas por uma jovem de provável etnia sueca, com seu impecável vestido Alberta Ferretti, elegante grife italiana, e um cativante sorriso de deusa escandinava. Muitos clientes do Fac passam por ali, e aproveitam a oportunidade para cumprimentá-la pelo dia do cabeleireiro, que é comemorado em 19 de janeiro, mas a jovem recebe esses cumprimentos todos os dias do ano.

Fac é muito estimado também pelas senhoras da Vila. Galanteador por índole, sempre tem um elogio de reserva. Ajuda as senhoras a estacionarem seus carros em frente ao salão, coloca seus celulares para recarregar enquanto são atendidas ao lado, e, às vezes, aconselha e acalma as mais jovens, que vivem às turras com os celulares e com os namorados, priorizando nessa ordem.

O atlético barbeiro não abre mão de uma boa partida de tênis, três vezes por semana em seu clube preferido, La Massafresca; após o jogo, no qual subjuga facilmente os adversários, ele caminha alegremente para o trabalho. A essa hora, a prestimosa moça loira já se encarregou de abrir e higienizar o salão, coordenando o eficiente trabalho realizado pelas suas lindas auxiliares.

São 9 horas, em uma radiosa manhã de uma estação qualquer, e o dia já vai começando no divertido salão. Fac somente atende com hora marcada, e exige pontualidade. O cliente que não atender essa exigência protocolar, recebe uma multa, que consiste em ouvir uma longa explicação, com infinitos detalhes, sobre a visita do Papa Francisco ao Brasil.

Fac termina sua preleção, informando ao faltoso que sua profissão foi regulamentada pela Lei nº 12.592, de 18 de janeiro de 2012, assinada pela presidente Dilma Rousseff. Portanto, muito respeito!

Logo chega (pontualmente!) o primeiro cliente, e então...

 

Causo I

O homem do alambique.

─ Bom dia, Fac!

─ Bom dia, Beto. O de sempre?

─ Sim.

Fac inicia o preparo do cabelo do cliente, e este começa a contar seu “causo”:

─ Sabe que neste final de semana fui visitar um amigo, que tem um alambique de cachaça em......

(segue)

 



[1] Coletânea de “causos” humorísticos, em elaboração.

 

publicado em 02/05/2014

 

 

 

 

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